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A ciclista e o ritmista, uma bike e o samba

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O ritmista Gabriel costa e a cabeleireira Navratinova Cardonha: ela emprestou a bike,  em troca ele está dando aulas de caixinha pra ela (foto: Jair Araújo/A Crítica)

Manaus ganhou um ciclista e a bateria de uma escola de samba uma ritmista. Explico.  Tudo começou com a cabeleireira Navratinova Cardonha, a Navra, ciclista há cinco anos e dona de quatro bikes. Então ela teve uma ideia e, em seu Facebook pessoal, disponibilizou uma delas para empréstimo por 15 ou 30 dias a qualquer um que morasse no bairro Dom Pedro, Zona Centro-Oeste de Manaus, ou próximo. Bastava responder a um questionário com dados pessoais e endereço, e assinar um termo de responsabilidade. Simples assim.

A Navra percebeu que muita gente gostaria de fazer suas atividades cotidianas de bicicleta, mas não tem uma ou não tem coragem, já que Manaus não é uma cidade tão ciclável assim. ‘’Colocando uma das minhas bicicletas à disposição para empréstimo dou oportunidade a outros de fazerem um teste e assim, quem sabe, passarem a usar bike também, estimulando-os a terem uma vida mais saudável, econômica e sustentável’’, conta.

Em menos de um dia a bicicleta já estava emprestada para o estudante Gabriel Costa por 30 dias, e já há duas pessoas na lista de espera.

Contudo, infelizmente, acidentes graves com ciclistas ainda são comuns em Manaus, o que desencoraja muita gente a sair pedalando por aí. A própria Navra já esteve envolvida em um, mas, segundo ela, não houve nada grave. ‘’O trânsito não é fácil, principalmente nas grandes vias. Os motoristas não respeitam. Tem que ter muita noção, percepção e calma pra utilizar a bicicleta no dia a dia’’, orienta.

Por isso Navra também se dispõe a ajudar quem empresta a pedalar com segurança por aí. ‘’Me disponho a acompanhar o beneficiado nos primeiros dias, sendo assim uma “bike anjo”. Sou autônoma, tenho essa flexibilidade. Levei o Gabriel até perto da casa dele, dei dicas de sinalização, como deve se portar no trânsito e, claro, passar as machas”, relata.

Como diz o ditado, ‘’gentileza gera gentileza’’. A Navra é torcedora da Escola de Samba Unidos do Alvorada e sempre quis tocar na bateria, mas não sabia nenhum instrumento. Acontece que o Gabriel é diretor de caixa da bateria da escola. Assim, enquanto ela o ensina a pedalar pelas ruas de Manaus com segurança, em troca ele está dando aulas de caixinha pra ela. ‘’A vida é massa’’, diz ela, radiante.

O Gabriel tem adorado poder vender trufas, ir aos ensaios da bateria e visitar a namorada de bicicleta. ‘’A ideia deveria ser expandida porque pedalar é muito bom’’, diz ele.

A ideia foi bem recebida por amigos, conhecidos e outros ciclistas da cidade, que pensam em fazer o mesmo. Para o coordenador do ”Pedala Manaus”, Paulo Aguiar, qualquer ação que estimule as pessoas a usarem a bicicleta é bem-vinda. ‘’Que mais pessoas com atitudes como essa [da bicicleta compartilhada] entendam como é importante promover pequenas ações que provocam grandes mudanças sociais’’, disse.

Luiz

Essa matéria também foi publicada no jornal A Crítica, no caderno de Cidades (página C3), no dia 11 de fevereiro de 2019

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Voltas e voltas

Já paguei 50 centavos (meia passagem) pra andar em ônibus com ar condicionado e televisão sintonizada na MTV em Manaus. Sério! Não é lenda urbana. Foi em 1999, antes da Virada do Milênio.

Aí chegou os anos 2000 e hoje, em novo milênio e em novo século, os usuários do transporte coletivo pagarão uma taxa de 50 centavos a mais em menos de um mês do último aumento – de R$ 3,30 a R$ 3,80.

Os ônibus não têm mais ar condicionado, é verdade, mas tem uma porção de goteiras em dias de chuva e se torna uma sauna ambulante em dias de calor (”pisa, motora, pro vento correr”, alguém sempre grita lá do fundão). Televisão? Só aquela 14 polegadas que o tiozinho carrega debaixo do braço quando precisa levar pro conserto.

Mas nem tudo são dores: tem jujuba e bala de mangarataia por apenas R$ 1. Picolé da massa e chocolate com gosto de sabão em pó, às vezes. E quem senta nos fundos tem uma experiência de montanha-russa quando o motorista desce a ladeira ou passa por um quebra-molas. Uma delícia!

Ah, e de vez em quando entram uns jovens muito enérgicos, portando objetos pontiagudos, que pedem, em altos decibéis, uma pequena contribuição dos passageiros em troca de um show de horror.

Quando não tem essa catarse coletiva, somos obrigados a descer do veículo antes de chegarmos ao nosso destino e, na ocasião, somos incentivados a interagir com outros passageiros até que chegue outro ônibus. Quantas amizades novas, negócios fechados e casamentos não saíram desses sublimes momentos de socialização… Mais eficaz que qualquer rede social.

Vejam só quanto exercício de virtude, divertimento e aprendizado podemos ter em uma só viagem de ônibus em Manaus. E pagaremos só R$ 3,80 por isso daqui pra frente.

Estamos na vanguarda e não sabemos.

Imagem: TV A Crítica/ captura: @Midia_AM

Luiz

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